A crescente crise no Haiti e suas violações humanitárias

Autoria por Victória Cristine Ramos, analista de comunicação e redação da ANAPRI.

Revisado por Elaine Silva da Luz, coordenadora de comunicação e redação da ANAPRI. 

Em março deste ano, a Organização Não-Governamental (ONG) Anistia Internacional escreveu uma nota expressando preocupação com a crescente onda de violência que ocorre no Haiti. Por meio desta, a ONG instou a comunidade internacional a tomar partido sobre as violações de direitos humanos que ocorrem no local. A crise humanitária presente no país caribenho teve seu início em 2021, após o assassinato do então presidente Jovenel Moïse (Anistia Internacional, 2024), após esse acontecimento, a vivência de gangues cresceu exponencialmente, com criminosos passando a controlar serviços essenciais, a exemplo dos aeroportos. Para entender esse contexto, no entanto, é necessário voltar alguns anos. 

Expressando de forma breve, é possível afirmar que o Haiti é um país marcado por grandes instabilidades políticas e econômicas durante toda sua história. Após a revolução de 1804, que culminou na independência do país, eles foram obrigados a ressarcir financeiramente a França, em um valor tão alto que só foi quitado no século seguinte, em 1947 (Estado de Minas, 2021). Além disso, o país também sofreu com a ditadura Duvalier, inicialmente nas mãos de François Duvalier, que, em 1962, instaurou um regime autoritário e de centralização política (Matijascic, 2010). A era Duvalier continuou pelos próximos anos, com Jean-Claude Duvalier, filho de François, assumindo o poder após a morte do pai. 

A violência de gangues voltou a crescer na década de 1980, com conflitos que ocorriam em todo o país. Jean-Claude não possuía as habilidades necessárias para controlar os ânimos internos, além de não possuir apoio majoritário por parte dos militares, por isso, o exército haitiano sugeriu que ele renunciasse em 1986 (Haggerty, 1991 apud Matijascic, 2010). Após essa renúncia, a presidência foi assumida pelos militares e a instabilidade presente no Haiti continuou. As primeiras eleições ocorreram em 1990, com Jean-Bertrand Aristide sendo eleito. No ano seguinte, contudo, após um golpe, Aristide foi destituído do cargo, retornado apenas em 1994, com o apoio dos Estados Unidos, da ONU e da Organização dos Estados Americanos (OEA) (Moraes, Andrade e Mattos, 2013). 

Em 2004, ele foi retirado do país por tropas estadunidenses que contavam com o apoio francês. Segundo Aristide, ele havia sido forçado a renunciar (Moraes; Andrade; Mattos, 2013). Com a cadeira do executivo vaga, quem assumiu o poder foi o presidente do Supremo Tribunal do Haiti, Bonifácio Alexandre. Ao observar tamanha instabilidade política, econômica e social, o mesmo pediu para que a ONU enviasse ajuda para conter a situação (Moraes; Andrade; Mattos, 2013). As Nações Unidas, então, estabeleceram uma Força Multinacional Interina (MIF, sigla em inglês) e posteriormente aprovou a resolução que instituiu a MINUSTAH.

De maneira bastante resumida, a MINUSTAH, ou Missão das Nações Unidas para a Estabilização do Haiti, foi uma Missão de Paz enviada ao país caribenho para acabar com as instabilidades que ocorriam na região, sobretudo a violência de gangues. Ao todo, a Missão durou 13 anos, e durante todo o período esteve sob o comando de militares brasileiros. Após a eleição de Jovenel Möise, a ONU assinou a Resolução 2350 para que fosse dado início a retirada dos Capacetes Azuis da região de maneira gradual, já em 2017. A Organização considerou que a operação  havia atingido os objetivos esperados e que o país estava, então, pacificado.

Contudo, à medida em que as tropas foram sendo retiradas do território haitiano, houve um novo crescimento de violência no país que culminou, como expresso anteriormente, na morte do presidente Möise. Em março deste ano, a crise tomou novos rumos drásticos após a fuga de mais de 3 mil presos (El País, 2024). Depois desse acontecimento, o primeiro-ministro, Ariel Henry, que havia assumido após o assassinato do ex-presidente, renunciou ao cargo. O líder de uma grande gangue no país chegou a afirmar que, caso não houvesse a renúncia de Henry, uma “guerra civil” poderia ocorrer (El País, 2024).

A nota da Anistia Internacional (2024) também chamou a atenção para o grande número de haitianos deslocados em decorrência dos conflitos, mais de 35 mil pessoas apenas nos primeiros meses de 2024. Muitas dessas pessoas vêm sofrendo com políticas racistas ao procurarem asilo em países como os Estados Unidos e a República Dominicana (Anistia Internacional, 2024). Por isso, a ONG chama a atenção para que a comunidade internacional tente auxiliar o Haiti. Além de documentar possíveis crimes que infringiram as leis do direito internacional bem como os direitos humanos que estejam acontecendo no território caribenho. 

REFERÊNCIAS 

El caos y una ola de violencia sin precedentes fuerzan la renuncia del primer ministro de Haití, Ariel Henry. El País, 2024. Disponível em: https://elpais.com/america/2024-03-12/el-caos-y-una-ola-de-violencia-sin-precedentes-fuerzan-la-renuncia-del-primer-ministro-de-haiti-ariel-henry.html. Acesso em: 17 abr. 2024.

Haiti: Grave crisis requires international condemnation and lasting solutions. Anistia Internacional, 2024. Disponível em: https://www.amnesty.org/en/latest/news/2024/03/haiti-crisis-requires-international-condemnation-lasting-solutions/. Acesso em 17 abr. 2024. 

MATIJASCIC, Vanessa Braga. Haiti: Uma História de Instabilidade Política. ANPUH/SP – UNESP-Franca. 06 a 10 de setembro de 2010.

MATTOS, Beatriz; MORAES, Isaias; ANDRADE, Carlos. A imigração haitiana para o Brasil: Causas e Desafios. Revista Conjuntura Astral, v. 4, n° 20, 2013.

VASCONCELOS, Sueli. Haiti: da independência à ditadura Duvalier. Estado de Minas, 2021. Disponível em: https://www.em.com.br/app/colunistas/sueli-vasconcelos/2021/07/12/noticia-sueli-vasconcelos,1285686/haiti-da-independencia-a-ditadura-duvalier.shtml. Acesso em: 1 abr. 2024.