A paradiplomacia de Québec, no Canadá | por Beatriz Nobre

Revisado por Elaine Silva da Luz, coordenadora de comunicação e redação da ANAPRI

O Canadá é um dos países nos quais a prática da paradiplomacia é mais avançada e não é por acaso que um dos primeiros intelectuais a tentar definir e se debruçar sobre o tema é um canadense, Panayotis Soldatos.

Dentre suas províncias, a de Québec é uma das mais ativas internacionalmente devido ao seu passado colonial pela França, o que a difere das demais entidades subnacionais do país, que falam o inglês. Québec tem o francês como único idioma oficial da província, apesar do inglês também ser falado na região (Québec Sem Fronteiras, s.d.).

Por conta desse histórico, a província tem continuamente se engajado internacionalmente, com grupos defendendo sua total independência do Canadá, com referendos sendo realizados em 1980 e em 1995, mas estes não foram bem-sucedidos (Québec Sem Fronteiras, s.d.). Tal perfil pode ser entendido como exemplo de protodiplomacia, isto é, quando o objetivo da atuação internacional está na reivindicação da soberania de entidade subnacional em questão (Junqueira, 2017).

De modo geral, o Governo do Québec (2024) apresenta em seu site oficial 3 diretrizes gerais para sua ação internacional: 1) a afirmação identitária, com a promoção de seus valores pela língua francesa e sua cultura; 2) a proximidade, priorizando as relações com as regiões vizinhas e 3) o aumento do caráter econômico na diplomacia quebequense.

Para entendermos um pouco mais do perfil atual da diplomacia de Québec, é importante observar como a economia passou a ganhar importância na pauta internacional da província. Inicialmente, a paradiplomacia quebequense era principalmente manifestada em ações que visavam sua afirmação cultural enquanto uma província de raízes francesas, tendo iniciado no século XIX (Reis, 2010). Dentre algumas das políticas desenvolvidas estavam o intercâmbio estudantil e de professores com países de língua francesa e reuniões com representantes destes mesmos países (Reis, 2010). No entanto, com o passar do tempo, a província expandiu sua ênfase para aspectos econômicos da paradiplomacia também.

A economia de Québec é forte na produção alimentícia, na de petróleo refinado e na de produtos farmacêuticos (Sercheli, 2022). Além disso, a província é destaque na indústria de tecnologias de ponta, sendo inclusive referência no desenvolvimento de inteligência artificial (Sercheli, 2022). 

Com estas características e o advento da globalização se desenvolvendo em paralelo, Québec, então, migrou de uma diplomacia majoritariamente cultural para uma ‘identidade econômica regional’, isto é, uma atuação internacional que visa a atração de recursos e turistas, com o fim de colocar a província no mapa internacional, impulsionando seus produtos e sua identidade (Reis, 2010).

Assim, é possível dizer que os principais fatores que condicionam a atuação internacional de Québec são: a) dentre os fatores internos, a organização federal do Estado canadense, a qual é altamente descentralizada e a sua própria trajetória de paradiplomacia identitária, e b) dentre os fatores externos, a globalização, que gera a necessidade de expandir as conexões econômicas e financeiras com outras localidades e os processos de integração regional, especialmente o NAFTA (1994), que fez crescer as interações de Québec com os governos subnacionais dos Estados Unidos (Martínez, 2018; Reis, 2010). 

Citamos ainda o Instituto da Diplomacia de Québec, entidade responsável por prover os representantes de Québec no mundo com as habilidades e o preparo necessário para desempenhar suas funções nos cargos (Governo de Québec, 2024). O Instituto está vinculado ao Ministério das Relações Internacionais e da Francofonia de Québec (Governo de Québec, 2024).

Com o Brasil, pode-se mencionar o recente encontro realizado com a Prefeitura de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, ocorrido em 2023, com fim de estabelecer acordos de trocas comerciais de produtos como a cerveja e de know-how tecnológico também (Prefeitura de Campo Grande, 2023).

Referências

GOVERNO DE QUÉBEC. Québec’s International Vision. Québec, 2024. Disponível em: <https://www.quebec.ca/en/government/policies-orientations/quebec-international-vision>. Acesso em: 08 jan. 2024.

JUNQUEIRA, Cairo. Paradiplomacia: a transformação do conceito nas relações internacionais e no Brasil. BIB – Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, São Paulo, n. 83, p. 43–68, 2017. Disponível em: https://bibanpocs.emnuvens.com.br/revista/article/view/429. Acesso em: 15 jan. 2024.

MARTÍNEZ, Roberto Z. La paradiplomacia de las províncias canadienses: los casos de Alberta, Québec y Columbia Británica. Revista de Relaciones Internacionales de la UNAM, n. 130, jan./abr. 2018, pp. 53-77.

PREFEITURA DE CAMPO GRANDE. Campo Grande recebe delegação de Québec, um dos principais parceiros comerciais do Brasil. Prefeitura de Campo Grande, 07 mar. 2023. Disponível em: <https://www.campogrande.ms.gov.br/cgnoticias/noticia/campo-grande-recebe-delegacao-de-quebec-um-dos-principais-parceiros-comerciais-do-brasil/>. Acesso em: 11 jan. 2024.

QUÉBEC SEM FRONTEIRAS. Sobre o Quebec. Québec Sem fronteiras, s.d. Disponível em: <https://quebecsemfronteiras.com.br/sobre-o-quebec/>. Acesso em: 11 jan. 2024.

REIS, Elton G. dos. A dimensão subnacional da inserção internacional: análise da paradiplomacia econômica de Québec. V Congreso Latinoamericano de Ciencia Política. Asociación Latinoamericana de Ciencia Política, Buenos Aires, 2010. Disponível em: http://www.aacademica.org/000-036/322. Acesso em: 11 jan. 2024.

SERCHELI, Janayna. Quebec. KLAPS Immigration Consulting, 15 mar. 2022. Disponível em: <https://klapsimm.com/quebec/>. Acesso em: 11 jan. 2024.