Crianças e os Direitos Humanos

Autora: Victória Cristine Ramos

Revisado por: Elaine S. da Luz, coordenadora de comunicação e redação da ANAPRI

Para Watson (2006), as crianças desempenham uma variedade de funções no sistema internacional. Elas trabalham – existe um grande índice de crianças em trabalho infantil, como veremos a seguir; e, entre outras funções, elas consomem, sendo hoje consideradas uma importante categoria de consumidores. No entanto, é recente o entendimento das crianças enquanto importantes atores da sociedade e portadores de direitos. 

Evidências apontam que o trabalho infantil já existia no Egito antigo, cerca de dois mil anos antes de Cristo (Nunes, 2009). Anteriormente à Revolução Industrial, as produções se concentravam nas áreas rurais e, por conta disso, era costume que as crianças trabalhassem auxiliando nas tarefas realizadas no campo. Contudo, conforme as inovações tecnologias fortaleceram o êxodo rural, o trabalho infantil passou a ser comum nas indústrias e minas de carvão, de forma mais intensa do que o que era exercido anteriormente (Nunes, 2009). Crianças com menos de dez anos de idade trabalhavam sob cargas horárias excessivas, em condições insalubres e sem segurança, recebendo salários inferiores aos que uma pessoa adulta ganhava. 

Essa situação persistiu por anos, até que o reconhecimento das necessidades das crianças passou a ser construído, gerando a criação de um movimento de proteção das mesmas (UNICEF, 2023). Foi apenas no início do século XX que normas de proteção para as crianças passaram a existir. A Liga das Nações, em 1924, adotou a Declaração de Genebra sobre os Direitos da Criança. A partir dela, as crianças deveriam ter proteção contra a exploração, direito à educação, ao desenvolvimento, entre outros. A Organização das Nações Unidas (ONU) criou o Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância – ou United Nations International Children’s Emergency Fund (UNICEF) –, para atender as necessidades das crianças durante os anos que sucederam a Segunda Guerra Mundial. Em 1953, o UNICEF tornou-se parte permanente da ONU. 

O principal instrumento de direito das crianças foi adotado décadas à frente, em 1989, por meio da Convenção sobre os Direitos da Criança. Esse é o instrumento de direitos humanos mais universalmente reconhecido, sendo ratificado por 196 países. A partir dele, as crianças passaram a ocupar uma posição no centro da luta pela efetiva aplicação universal dos direitos humanos (Watson, 2006). Esse mecanismo estabelece padrões de proteção das crianças, incluindo também a obrigação do Estado em protegê-las de exploração econômica e qualquer trabalho considerado perigoso. Ainda nesse mesmo âmbito, é dever dos Estados Partes implementar uma idade mínima para ingresso no trabalho e regulamentações relativas às condições e horários de trabalho, bem como penalidades para o não cumprimento dessas medidas. 

Contudo, apesar desse enorme avanço nos direitos das crianças, o que se verifica na prática diverge bastante quanto a isso. Segundo dados presentes no relatório de 2021 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) em parceria com o UNICEF, ao redor do mundo, mais de 150 milhões de crianças estão envolvidas em trabalho infantil, e cerca de 79 milhões delas realizam trabalhos considerados perigosos. O mesmo relatório demonstra que, caso os Estados não tomem ações rápidas e efetivas, em 2030 mais de 120 milhões de crianças estarão inseridas em trabalho infantil. Esse dado é preocupante e entra em conflito com as metas propostas pela Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS), em específico o ODS 8. Este está relacionado ao trabalho decente e crescimento econômico e possui como meta 8.7 a erradicação do trabalho infantil até 2025. 

Em suma, vemos que, embora grandes avanços tenham sido feitos com relação aos direitos das crianças, muita coisa continua como era séculos atrás. Mesmo com presença de mecanismos internacionais de garantia de direitos humanos para esses indicados, os índices de trabalho infantil continuam a crescer com o passar dos anos. É necessário que os Estados tomem medidas para proteger as crianças e não permitir que situações como as que foram relatadas neste texto continuem a existir.  

 

REFERÊNCIAS 

NUNES, Isaias Barbosa. Trabalho Infantil na Revolução Industiral Inglesa: Uma Contribuição ao Trabalho Docente na Sétima Série. Curitiba, p. 1-21, 2009. 

ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT) E FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA AS CRIANÇAS (UNICEF). Children’s Fund, Child Labour: Global estimates 2020, trends and the road forward. Nova Iorque, p. 1-88, 2021.

UMA história dos Direitos da Criança. UNICEF, 2023. Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/historia-dos-direitos-da-crianca. Acesso em: 23 out de 2023. 

WATSON, Alison M. S. Children and International Relations: a new site of knowledge? Review of International Studies, S.I, v. 32, n. 2, p. 235-250, 2006.